O barbeiro Chico e a camisa do ídolo Zé do Carmo
Chico, criado entre os bairros
recifenses do Barro e Tejipió, onde era conhecido por Quico, exerce a profissão
de barbeiro no Mercado de Boa Viagem. O simpático Francisco Lima, sempre aberto
para um papo, desde que não esteja usando a tesoura na cabeça de alguém, é estabelecido
junto do bar de Chade, tradicional ponto de uma turma que vai lá para jogar
conversa fora e álcool dentro.
O barbeiro Chico é um torcedor
ferrenho do Santa Cruz, não importa em que série do Brasileirão o Clube das
Multidões se encontre. Essa condição foi herdada do pai, também conhecido por
Chico. Renomado craque nas peladas recifenses, na juventude Chico I recusou
convite do treinador e ‘olheiro’ Waldomiro Silva para fazer testes no Botafogo.
Não aceitou por causa de compromissos familiares. Órfão, era arrimo de família.
Não vai mais aos estádios, porém continua amando o Santinha, de corpo e alma,
como cantou o compositor Sebastião Rosendo.
Também tricolor fiel, Chico II,
fez amizade com Anum, figura tradicional no Arruda, lavador dos carros de
jogadores e diretores, que sempre lhe abria uma brecha no estacionamento. Terminou
se aproximando de Luís, roupeiro do Santinha. Conversa puxa conversa, chegou-se
à conclusão de que o encarregado da rouparia do Arruda fora companheiro de
peladas de Chico I.
O ardoroso adepto da Cobra
Coral Chico II, a convite de Luís, certa
vez adentrou o vestiário e ficou deslumbrado ao ver alguns ídolos de perto.
Logo foi presenteado com uma
camisa do clube de sua paixão. Aliás, duas, uma para ele e a outra para o pai.
A do filho passou a ser indumentária obrigatória nas idas ao Arruda para ver o
Tricolor jogar.
Um dia ao sair do estádio,
rumando com sua galera para a Churrascaria Colosso, situada numa dependência
externa do Mundão, para esperar que o burburinho diminuísse, sorvendo umas cervas,
ao passar pela porta do vestiário coral, Chico deparou-se com Zé do Carmo. Como
só via os craques de longe, teve um sobressalto, uma vez que a camisa de número
5 que usava tinha sido vestida pelo volante em muitos jogos. Eufórico, pediu
para Zé do Carmo autografá-la. Solícito, o jogador prontamente lhe atendeu. E
teve ainda um acréscimo. Ricardo Rocha, que acompanhava Zé, também deixou sua
assinatura ali. Em casa, Chico guardou aquela preciosidade num envelope desses
grandes, que ficou intocável e imexível.
Certa vez, recebendo a visita
de um amigo, também torcedor do Santa Cruz, falou-lhe da ‘joia’ que possuía,
uma camisa da Cobrinha autografada por duas figuras marcantes do time. Seu
comparsa tricolor não acreditou, obrigando Chico a lhe mostrar a ‘relíquia’,
naquela de ver para crer. Grande foi sua surpresa ao notar que a camisa já não
estava da mesma forma que ele havia deixado. Quase cai de costas quando
descobriu que já não mais existiam os autógrafos de Zé do Carmo e Ricardo
Rocha.
Abriu uma sindicância
doméstica e só precisou de alguns minutos para matar a charada. Sua zelosa esposa
um certo dia tratou de lavar a camisa suada e suja, com “aquelas assinaturas
escritas com caneta...”
Ou seja, por excesso de zelo
em sua casa, o tricolor Chico perdeu um tesouro irrecuperável. Já não tinha de
que se gogar diante de quem chegasse por lá. Ainda hoje lamenta, mas fazer o
que? A não ser lembrar uma antiga marchinha de carnaval que dizia “a água lava,
lava tudo...”
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