O representante do Santa Cruz sobrou na Candelária



Waldomiro Silva, um dos vultos da história do Santa Cruz, principalmente da fase em que o Tricolor vivia na pindaíba e jogava nos campos dos outros, era uma pessoa muito bem relacionada. Nascido em Brejo da Madre de Deus, viveu parte de sua pobre infância em Caruaru. Saiu corrido para o Recife, com medo de levar uma surra de um soldado em quem tinha atirado uma pedra, que foi cair inteirinha numa pereba que o homem da lei carregava numa das pernas. Imaginem a dor...

Waldomiro era técnico do juvenil e revelou uma série de jogadores. Destacava-se como um descobridor de talentos, principalmente em Santo Amaro, onde residia. Vários garotos bons de bola, como o volante Zequinha, reserva de Zito na seleção bicampeã mundial em 1962, no Chile, pintaram no Arruda levados por ele. Chegou a assumir provisoriamente o comando do time principal do Mais Querido, em 1956, quando o Santa foi campeão do Torneio Pernambuco-Bahia. O técnico Oto Vieira tinha saído, e o clube não havia contratado seu substituto. Waldomiro Silva dá nome a um CT que o clube do Arruda tem em Dois Unidos.

Praticante dos cultos africanos, era considerado uma espécie de pai espiritual do Santinha. Sempre procurava a proteção dos terreiros para o clube que tanto amava. Morreu de repente após sentir-se mal em pleno Mundão do Arruda, momentos antes de ser focalizado numa reportagem de tevê.

Waldomiro homenageado pelo amigo, com a faixa de campeão paulista pelo Corinthians


Waldomiro Silva tinha um extenso círculo de amigos. Um deles era Osvaldo Brandão, que dirigiu várias equipes, principalmente em São Paulo, e a Seleção Brasileira. Também chegado à umbanda, Brandão sempre recorria a Waldomiro quando estava em apuros. Os pitacos do brejense foram decisivos para a convocação do volante Givanildo para a Canarinha, em 1976.

Certa vez Waldomiro foi ao Rio tratar de negócios. Tinha lido num jornal, antes mesmo de viajar, que a CBF, fundada em 1919 com a sigla CBD (Confederação Brasileira de Desportos) estava comemorando seu septuagenário e que haveria uma Missa de Ação de Graças, na igreja da Candelária.

Uma vez na Cidade Maravilhosa, resolveu comparecer ao ato religioso, no qual certamente reencontraria muita gente de seu relacionamento. Saiu do hotel bem arrumado, como a situação exigia, junto com a esposa, e pegou um táxi. Esperava dar um forte abraço no presidente da CBF, almirante Heleno Nunes, que havia servido no Recife durante a Segunda Guerra Mundial, como oficial da Marinha, tendo sido dirigente do Portela, um clube de Jaboatão dos Guararapes muito famoso no  futebol suburbano e que chegou a disputar a primeira divisão. Outro que seria efusivamente abraçado era o então treinador da Canarinha, Cláudio Coutinho.

Ao descer do automóvel, Waldomiro ficou espantado com a quantidade de carros espalhados pelas imediações do templo. Ao se aproximar da entrada foi abordado por uma jovem, que, exibindo um livro de presença, pediu seu nome. “Waldomiro Silva, do Santa Cruz”, disse com um certo orgulho.

Uma vez lá dentro postou-se num local estratégico e começou a procurar as caras conhecidas no meio daquela pequena multidão. Não viu ninguém. “O pessoal mais ligado à CBF deve estar lá na frente, junto do altar”, pensou. Pouco depois passou um jornalista esportivo que o reconheceu e cumprimentou-o, o que reforçou seu pensamento.

Terminada a missa, começa o movimento das pessoas para sair, enquanto muitos dirigem-se a um grupo, logicamente o comando da CBF, para os cumprimentos de praxe. Lá se foi Waldó cumprimentar, em nome do Santinha, a cartolagem nacional. Mais para perto ficou meio sem graça por não descobrir nenhum daqueles rostos com os quais estava tão acostumado.

 Desconfiado, dirigiu-se a um cidadão, que, compenetrado, trajando paletó e gravata, aguardava o momento de entrar na fila. Perguntou onde estavam os diretores da CBF e deixou seu interlocutor meio aéreo. Logo tudo ficou esclarecido. Aquela tinha sido uma missa de sétimo dia pela alma da matriarca de uma família de muito prestígio na sociedade carioca, que morrera de acidente automobilístico.

Muito sem graça, Waldó só fez dar meia-volta e sem mais nada a fazer na Candelária, “saiu pela porta por onde entrou”. Depois é que soube que a missa da CBF tinha mudado de igreja.  


Comentários