Em 2012, aos 88 anos de idade, o desportista Luiz Lacerda, morto nesta terça-feira, 15/10/2019, falou aos jornalistas LENIVALDO ARAGÃO e JOSÉ NEVES CABRAL da Revista
Clássico.Com sobre suas atividades desportivas e empresariais. Confira:.
Sabedoria e simplicidade
caminham junto com Luiz Lacerda, presidente do Central em vários mandatos e que
empresta o nome ao principal estádio do interior pernambucano. Aos 88 anos, ele
recebeu a reportagem da Revista
Clássico.Com para uma entrevista.
O papo poderia ter sido
apenas sobre seu clube de coração, mas como conversar com Luiz Lacerda sem
falar de Limoeiro, sua terra natal, dos negócios, de seu empreendedorismo?
Apaixonado por futebol, ele sempre bateu peladas com os amigos e tornou-se o
dirigente mais conhecido do Agreste, mas como empresário deu passos ainda mais
largos, tornando-se um verdadeiro artilheiro da economia pernambucana. Com sua
visão de futuro, primeiro conseguiu importar o hoje tradicional azeite Gallo
para o Nordeste.
Posteriormente, se tornaria
o principal importador e distribuidor de bacalhau do Brasil, posição que
ostenta até hoje. Nascido no Sítio Boi Seco, saiu de Limoeiro ainda jovem para
trabalhar na Capital do Agreste, atendendo conselho do sábio professor Antônio
Vilaça, pai do escritor, ex-presidente da ABL e ministro do Tribunal de Contas
da União Marcus Vinicius Vilaça. Antes de trabalhar por conta própria foi
funcionário de Zé Bodinho, rico empresário do setor de varejo pernambucano no
século passado. Diariamente pratica exercícios na modalidade Pilates e cumpre
expediente em seu escritório, no térreo da Rádio
Liberdade AM e FM, de sua propriedade, dando um exemplo de disciplina aos
funcionários e colaboradores.
Luiz Lacerda na Clássico, caricaturado por Humberto |
Homem de prestígio em
Caruaru, Seu Luiz preferiu não entrar na política por não considerar esta a sua
praia, mas apoia a filha, Miriam Lacerda (DEM), candidata a prefeita do município.
Segundo Ivan Feitosa, diretor executivo da Liberdade, Luiz Lacerda costuma
seguir alguns conceitos para obter êxito em suas ações, entre os quais: “Deixe
que o mundo falhe com você, mas nunca falhe com o mundo; honre sempre seus
compromissos; palavra dada, palavra cumprida; seja vaidoso, mas tenha a verdade
coletiva, o vaidoso individual sempre se dá mal.”
REVISTA
CLÁSSICO.COM – O senhor nasceu em Limoeiro numa época em
que o município tinha como chefe político o coronel Chico Heráclio, famoso por
suas histórias. Ele era brabo mesmo?
LUIZ
LACERDA – Chico Heráclio não era brabo, era frouxo. Agora, ele
amedrontava com a boca. Quem não rezasse na cartilha dele, ele podia até
expulsar. Certa vez, foi desafiado por um chefe político de Cumaru, que o
chamou para ir até lá. E ele não foi não, meu filho. Agora, ele se preocupava
com duas coisas em Limoeiro, saúde e educação. A melhor educação de Pernambuco
era dada pelos Vilaças. Antônio Vilaça, pai de Marcus Vinicius Vilaça, foi meu
professor e secretário de Educação de Limoeiro na época de Chico Heráclio. Ele
foi muito importante na minha formação e me deu orientação até para vir para
Caruaru iniciar minha vida no trabalho. Ele me disse o que representava
Caruaru, cidade que tinha uma localização geográfica excelente e que iria crescer
bastante, o que beneficiaria o desenvolvimento das pessoas que aqui
investissem.
RC – Na época, o Central
chegou até a disputar turno com os grandes da Capital. A que o senhor atribui o
fato de o Central estar deixando de ser a quarta força do futebol pernambucano,
perdendo espaço para outros do Interior?
LL – Nada é eterno. O
Central teve sua fase boa. Minha grande frustração foi nunca ter sido campeão
pernambucano, mas coloquei o time na Primeira Divisão do futebol brasileiro. É
porque passei tanto tempo no Central, que acho que foi por isso que o time não
foi campeão pernambucano. Lá eu fui até ditador (risos).
Uma vida dedicada aos negócios e voltada para o Central (Reprodução internet) |
RC – Quando o senhor conseguiu
a concessão para inaugurar a Rádio
Liberdade já pensava na contribuição que a rádio poderia dar para o crescimento
do clube?
LL – Quem trouxe a sugestão
foi Edécio Lopes, radialista limoeirense que trabalhava na Rádio Cultura. Gostei da ideia e a partir daí iniciamos os contatos
para obter a concessão. A rádio seria uma importante ferramenta para divulgar o
clube e promover a cidadania. Edécio cuidou da parte técnica, compra de
equipamentos, e eu fui conversar com o gerente do Banco do Povo, Gercino
Tabosa, meu amigo, para que ele me ajudasse a obter a concessão, pois era amigo
de um ministro do governo do presidente Humberto de Alencar Castello Branco. Gercino
escreveu uma carta que Edécio levou para o ministro e em três meses a concessão
foi aprovada.
RC – Como o senhor está
vendo o futebol pernambucano hoje?
LL – É preciso gostar de
fazer para se aproximar da perfeição. Atualmente, se planeja muito, mas é
preciso executar.
RC – O senhor tem ideia de
quanto gastou no Central naquela época?
LL – Nem quero ter, mas costumo
dizer que foi dinheiro que matuto besta não sabe nem contar. Agora, nunca fui
olhar o que gastei, só olhava o resultado. O que eu posso dizer é que trabalhei
na base da gratidão. Onde cheguei, encontrei pessoas que me ajudaram muito, que
me faziam favores e eu respondia a elas com gratidão.
RC – Por ser Caruaru uma
cidade importante do Estado, os empresários locais poderiam dar mais apoio ao
Central. O senhor sentiu essa falta de apoio?
LL – Eu tive esse apoio, mas
não posso falar da capacidade dos outros. Agora, eu tinha atrevimento, sabia
ousar. Consegui apoio de muitas pessoas, como Roberto Bezerra, e isso na época
em que fui até ditador. Eu era o presidente executivo, Elias de Oliveira, o
presidente do Conselho Deliberativo. E José Queiroz (atual prefeito de
Caruaru), o secretário do Conselho. Então, o Executivo só faz comprar jogador,
mas pra vender tinha que ter a aprovação do Conselho.
RC – Durante a sua passagem
pelo Central, o senhor tinha uma pessoa de confiança, que era Alcides Lima.
Como era essa relação?
LL – Quando eu tinha um
problema para resolver, gostava de resolver logo, e eu sabia que Alcides era
cricri. Eu dizia: vá à FPF e resolva. Ele ia e se a Federação estivesse
fechada, ele batia na porta da casa de Rubem Moreira e só voltava com a missão
cumprida.
RC – Sua convivência com
Rubem Moreira era boa?
LL – Houve época em que a
gente quase saía na tapa, mas depois conversava e resolvia tudo. Certa vez, ele
veio aqui, não me encontrou e foi atrás de mim num sítio onde eu jogava bola. Era
um dia de chuva. Rubem veio e, brabo, disse: “Olhe, seu merda, você precisa
fazer isso pra mim.” Era para resolver uma mudança de campo de jogo do Central
porque daria mais renda, coisa e tal. E eu resolvi. Certa vez fui eleito pela
crônica esportiva de Pernambuco como o presidente do ano. Isso muito me orgulha
porque havia grandes dirigentes na época.
RC – Como era seu
relacionamento com os jogadores?
LL – Os jogadores não me conheciam,
conheciam o nome e a fama. Mas quando iam embora vinham falar comigo. Eles
agradeciam o respeito com que haviam sido tratados no Central.
RC – E o negócio do
bacalhau?
LL – Desde o início percebi
que como o poder aquisitivo da população do Nordeste é menor em relação ao Sul,
nossa região tinha mais a ver com o bacalhau Saithe, que é uma espécie mais
popular, porém, com o mesmo gosto do Cod ou do Ling. Há apenas uma diferença na
pele, mas o sabor e o odor são os mesmos. Graças a Deus, tenho um crédito muito
grande no exterior, pois, sempre honrei meus compromissos. Comecei oferecendo o
bacalhau Saithe aos mercados de Pernambuco e Bahia, mas a demanda foi avançando
até chegar a São Paulo. Havíamos derrubado uma espécie de preconceito e cheguei
até a ouvir comerciantes sulistas indagarem – quem é esse cara de Caruaru?
Comentários
Postar um comentário