HISTÓRIAS DO MUNDO DA BOLA-Lenivaldo Aragão

 

Ilustração de Humberto Araújo

 

A malandragem de Edgar esbarrou na esperteza do técnico Duque



 

O boa-vida Edgar sempre foi um gozador. Ponta-direita, quando defendia o Náutico estava sempre aprontando. Mas caiu em desgraça com o técnico Duque.

Filho de um conselheiro alvirrubro, também chamado Edgar, este não queria que o filho jogasse por dinheiro no clube de seu coração. Portanto, Edgar, cuja principal característica era a velocidade, tratava-se, para o treinador, de  um jogador que não tinha muito futuro. No raciocínio da velha raposa mineira, Dega, como era conhecido na intimidade, não precisava de futebol para viver e, assim sendo, não levava a coisa a sério. O próprio Edgar fazia por onde o chefe alimentar esse preconceito. Sabendo que não seria multado, como os outros, sempre dava suas escorregadas. E a vingança de Duque era barrá-lo.  

            Houve um tempo em que o Náutico estava bem servido de ponta-direita. Além de Edgar, Duque contava com Tonho Boiadeiro, egresso do Bangu, e com o argentino Ortiz, além de Ladeira, que, mesmo sendo meia, quebrava o galho na beirada do campo, como se diz hoje em dia. Com tanta gente para o setor e com a permanente aversão de Duque, não à pessoa, mas ao jogador, o destino de Edgar não podia ser outro, que não fosse o “time da laranja”.

            Achando que nem tão cedo teria uma chance, Edgar relaxou e passou a ser um assíduo frequentador do DM. O médico  Bráulio Pimentel era quem aguentava o tombo, diante de uma eterna faringite do jogador, que, é bom que se diga, não colaborava muito para ficar curado. Se o treino era debaixo de chuva, por exemplo, Edgar não saía do vestiário, para desespero de Duque.

            – Que jogador é esse que eu tenho, que não pode levar chuva e nem pode levar sol? – indagava o treinador em tom zombeteiro.

            A coisa ficou divertida porque a faringite de Edgar costumava se manifestar quando era dia de ginástica ou treino técnico. Mas se havia coletivo ou dois-toques, o ponta milagrosamente se recuperava. Porém, logo voltava a adoecer.

            Só que na escola em que Edgar ainda era aprendiz, o velho Duque tinha sido expulso por excesso de esperteza. Em dado momento, o técnico malandro resolveu aplicar o velho ditado “um dia é da caça,  outro dia é do caçador”. Programou um coletivo, ou pelo menos, marcou no quadro negro. Edgar chegou aos Aflitos, viu os jogadores no maior papo debaixo das antigas arquibancadas, ficou meio desconfiado, pois era para eles estarem no gramado, preparando-se, mas se dirigiu ao vestiário, onde se demorou bastante. Deu uma olhada para dentro do campo por uma das antigas janelinhas de ventilação, que não existem mais, e viu os companheiros iniciando um bate-bola pra valer, antes do dois-toques. Achando que o treino seria só aquilo, Edgar improvisou um curativo, colocando algodão e esparadrapo no pescoço, alegando no mais puro cinismo que estava com as amígdalas inflamadas. Realmente, era o dia da “caça”. Duque ao ver a pantomima não perdoou:

            – Major (ele sempre tratava as pessoas assim), outra desculpa porque essa tá muito fraca. Quem já viu se aplicar medicação nas amígdalas desse jeito?

            Edgar não teve mesmo saída, tendo recebido um castigo: carregar o pesado goleiro Lula Monstrinho, nos ombros, de uma barra a outra. E cumpriu a pena sob a greia geral da boleirada alvirrubra.

 

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