Jurandir na Soparia do Gordo, ainda no clima dos 105 anos do Central (Reprodução) |
O goleiro pernambucano que não quis fazer festa para o Rei
Jurandir, muito festejado em
Caruaru, ainda no clima da comemoração do 105º aniversário do Central Sport Club,
compareceu à Churrascaria do Gordo, cujas paredes são cobertas por fotografias
do Alvinegro, que ele defendeu no início
da carreira.
Vejo a
imagem de Jurandir e logo meu pensamento se transporta para a longínqua tarde
de 16/11/1969. Em Salvador, o Estádio da
Fonte Nova, recebia 37.378 pagantes. Depois de ter enfrentado o Santa
Cruz e o Botafogo paraibano, este num amistoso, Pelé esperava encerrar seu
curto périplo pelo Nordeste, marcando o ansiado e badalado milésimo gol. Porém,
o pernambucano de Afogados da Ingazeira, caruaruense por adoção desde os três
anos de idade, quando a famíia se mudou para Caruaru, Jurandir Salvador dos
Santos (18-11-1944) não estava nem um pouco interessado em entrar na biografia do
Rei. Isso se podia deduzir de uma sua entrevista por ele concedida ao jornal A
TARDE, da capital baiana:
– Sou pago para defender o gol
da minha equipe. É exatamente isso que vou fazer contra o Santos. Acho difícil
que ele marque o milésimo em mim.
Eu acompanhava o Santos naquele
trajeto final em busca do tal gol, para um tabloide especial que foi publicado
pelo DIARIO DE PERNAMBUCO. Hospedei-me no Hotel Plaza, na Avenida Sete, onde a
delegação santista estava. Um ou outro jogador aparecia no saguão. Pelé, o alvo
de todas as atenções, chegou a sair para
conhecer um terreno com que seria presenteado em área nobre da metrópole
soteropolitana.
O jogo do Peixe, na época, o
melhor time do Brasil, contra o Esquadrão de Aço, valia pelo antigo Torneio
Roberto Gomes Pedrosa, o Robertão, que dois anos depois, 1971, reformulado, passaria
a ser chamado de Campeonato Nacional.
PROPOSTA INDECENTE
Outro dia conversei com Jurandir
por telefone. Fiquei espantado quando ele me disse que recebeu oferta de um
apartamento e mais dinheiro vivo, por intermédio de um figurão do próprio Bahia
para deixar Pelé balançar sua rede. Certamente, o Bahia festejaria e se
promoveria com o fato.
Segundo A TARDE, um ex-deputado estadual
e ex-presidente e diretor do Bahia ameaçou a família de Jurandir e ofereceu
dinheiro para que o gol acontecesse naquela tarde. A grana era em cruzeiros novos, algo equivalente a 700
mil reais.
– Ele me ofereceu dinheiro e
disse que eu ficaria independente para o resto da vida. Mas eu disse que minha
dignidade não tinha preço. Eu disse que se ele tocasse na minha família era ele
que responderia. Depois do jogo ele sumiu. Eu fui e logo abri a boca com a
imprensa. Graças a Deus fui considerado no dia a principal figura da partida.
Dizem que não fui inteligente, mas com o passar do tempo vi que aquilo era
insignificante – afirmou o ex-goleiro.
Jurandir foi o último jogador a
entrar em campo. Ao seu lado, o técnico do Bahia, o paraguaio Fleitas Solich,
tricampeão carioca com o Flamengo (1953/54/55) e que, entre outros havia
dirigido o Real Madrid, no tempo dos célebres Di Stefano e Puskas.
Foto: Reprodução Canal 100 |
O MILAGRE
O Bahia fez 1 x 0 com Baiaco, e Jair
Bala empatou para o Santos, definindo o placar do jogo em 1 x 1.
Em campo, além de Jurandir havia
outros dois pernambucanos, o lateral-direito Mura, do Bahia, e o
lateral-esquerdo Rildo, do Santos. Também
defendendo o Esquadrão de Aço, o zagueiro Adevaldo, que mais tarde jogaria
pelo Santa Cruz.
Pelé tentou o tal milésimo
várias vezes, sem êxito. O lance que ficou marcado para sempre na lembrança dos
torcedores e na mídia foi aquele em que o
zagueiro Nildo salvou a situação, o que Jurandir, um sertanejo de muita
fé, atribui à proteção divina:
– O Santos começou a tabelar,
Coutinho tocou para Clodoaldo, que lançou Pelé. Ele fez que ia chutar e eu caí.
Ele me driblou, chutou e a bola ia entrar. Ali foi coisa de Deus, milagre. A
bola ia entrar, não tinha como defender. O lance foi tão rápido que ninguém
viu. Nildo "Birro Doido" se jogou contra a bola e a bola foi na trave.
Paes, que era lateral-esquerdo da Seleção Argentina, vinha em seguida e mandou
para escanteio.
O lance está assim escrito
numa das inúmeras matérias escritas sobre o jogo:
“A jogada toda teve a
assinatura do Rei. Visão de jogo, posicionamento, arranque, drible e conclusão.
Conjunto perfeito para aquele que seria um dos gols mais importantes do futebol
brasileiro, o milésimo do seu maior jogador. O goleiro já tinha ficado para
trás há alguns passos. Pelé estava cara a cara com o gol. O lance, porém, teve
um desfecho improvável. Com a mesma rapidez de Pelé, moldada, sobretudo, pela
raça, o zagueiro Nildo adiou a festa do milésimo. Com o pé esquerdo desviou a
bola em cima da linha e, por segundos, fez o camisa 10 flertar com o deespero”.
A jogada toda
teve assinatura do Rei. Visão de jogo, posicionamento, arranque, drible e
conclusão. Conjunto perfeito para aquele que seria um dos gols mais importantes
do futebol brasileiro, o milésimo de seu maior jogador. O goleiro já tinha
ficado para trás há alguns passos, Pelé estava cara a cara com o gol. O lance,
porém, teve um desfecho improvável.
Com
a mesma rapidez de Pelé, moldada sobretudo pela raça, o zagueiro Nildon adiou a
festa do milésimo. Com o pé esquerdo, desviou a bola em cima da linha e, por
segundos, fez o camisa 10 santista flertar com o desespero.
GOLPE DE BOXEADOR
O pernambucano parece estar
revivendo o célebre duelo com o melhor jogador do mundo:
– Eu praticava boxe também, por
conta dos cruzamentos na área. Na primeira bola eu socava a bola e o atacante.
Na primeira bola eu fiz isso com Pelé, ele saltou, mas encolheu o pescoço. Ele
xingou, xingou muito no jogo. Pelé me disse que eu ia ficar famoso, mas eu
disse que não queria essa fama. O tipo de fama que eu queria era que ele não
fizesse o gol.
Ainda hoje corre a lenda de que
todo o estádio vaiou quando a defesa do Bahia evitou o tal gol no lance
descrito por Jurandir. Houve a tal vaia, sim, mas os torcedores do tricolor
baiano aplaudiram. Só um ou outro torcedor do Esquadrão de Aço queria o
milésimo gol de Pelé naquela tarde.
Jurandir jogou no Central, antes
de o Alvinegro ter entrado no Campeonato Pernambucano, o que aconteceu em 1961.
Defendeu outras equipes, como o Vera Cruz e o América, este um dos times
amadores da Capital do Agreste. Foi descoberto pelo Bahia em 1967, quando
defendia o CSA, já como profissional.
Anos depois, já em fim de carreira voltou a vestir a camisa da Patativa, mas
por pouco tempo e como mero figurante. Outras equipes que defendeu foram ASA
(AL); Leônico, Botafogo e Ypiranga (BA); Sampaio Corrêa (MA); Ferroviário,
Icasa, Maguary e Guarany (CE);
Desportiva Guarabira e Treze (PB) e Confiança (SE).
Local: Fonte Nova, Salvador-BA
Renda: NCr$ 189.909,00
Público: 37.378
Árbitro: Arnaldo Cesar Coelho-RJ
Gols: Baiaco (Bah) e Jair Bala
(San)
BAHIA: Jurandir; Mura, Adevaldo,
Nildo e Paes; Amorim e Eliseu; Manezinho, Zé Eduardo (Sanfilippo), Carlinhos
(Baiaco) e Artur. Técnico: Fleitas Solich.
SANTOS: Agnaldo; Turcão, Ramos
Delgado, Djalma Dias e Rildo; Clodoaldo e Lima (Joel Camargo); Manoel Maria,
Edu, Pelé e Abel (Jair Bala). Técnico: Antoninho.
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