Ilustração do artista Bajado |
Quando a Cobrinha se diverte
Lenivaldo Aragão
Além das músicas de Capiba e Nelson Ferreira, abordadas em reportagem
anterior, o Santa Cruz foi aquinhoado com outros frevos-canção, como Cobrinha no Gramado, que
rivaliza com o Mais Querido,
de Capiba, na preferência dos torcedores. Foi composto em 1942 por Sebastião
Rosendo. Torcedor do Santinha, participante dos programas de auditório da Rádio
Clube de Pernambuco, como cantor, ele atendeu a um pedido de Aristófanes de
Andrade, um baluarte do Santa Cruz, do qual foi presidente mais de uma vez,
retratado, inclusive, por um busto colocado à entrada do Estádio José do Rego
Maciel, ao pé do elevador.
Como os clubes pernambucanos são simbolizados por animais, ao
atender à solicitação de Aristófanes, Sebastião deu ênfase à ‘fauna’
futebolística da Terra dos Altos Coqueiros. Gravada originalmente por Expedito
Baracho, a música, denominada COBRINHA NO GRAMADO, além de se constituir
numa declaração de amor, procura amedrontar os adversários da Cobra Coral.
Eu sou Santa Cruz de corpo e alma
E serei sempre de coração
Pois a Cobrinha quando entra no gramado
Eu fico todo arrepiado
E torço com satisfação
Sai, sai Timbu
Deixa de prosa oh seu Leão
Periquito, cuidado com lotação
Que matou Pássaro Preto
Santa Cruz é tradição
(Para a compreensão do leitor:
Cobrinha – Santa Cruz
Timbu – Náutico
Leão – Sport
Periquito – América
Lotação – o extinto Auto Esporte,
clube dos motoristas
Pássaro Preto – Íbis).
Um trecho da frase
inicial da música dá nome ao livro em três volumes “Santa Cruz de Corpo
e Alma”, escrito por vários jornalistas e coordenado pelo falecido João Caixero.
A obra lançada em agosto de 2016.
Sebastião Rosendo |
Sebastião Rosendo contribuiu outra vez para aumentar o repertório do Santa Cruz na frevança, com PENTACAMPEÃO, elaborado em 1973, em parceria com Gildo Branco, gerente do Clube Português do Recife. O objetivo era homenagear o pentacampeonato coral (1969 a 1973):
Somos pentacampeões
Com raça, orgulho e amor
Santa Cruz é tradição
É um prazer dizer sou tricolor
Seu pavilhão tremula sempre
Num eterno pedestal
O seu passado de glórias
Tornou-se tradicional
O mais querido Santa Cruz
Presente às multidões
Vamos cantar e sorrir, família tricolor
Somos pentacampeões.
PAPA TAÇAS
Durante muito tempo, João e Artur Valença formaram a célebre dupla Irmãos Valença, com uma forte presença no cancioneiro pernambucano, principalmente no Carnaval. TEU CABELO NÃO NEGA, composto por eles, inicialmente com o nome de MULATA, custou um processo que se arrastou por muitos anos contra o famoso Lamartine Babo.
– Ele apossou-se de nossa música, fez algumas alterações e
gravou com o nome de “Teu Cabelo Não Nega”, como se fosse sua – disse-me certa
vez João Valença.
Eles saíram vitoriosos e passaram a ter seus nomes inseridos nos
discos, como parceiros de Lamartine ou vice-versa.
Apaixonados pelo Santa, baseados numa cançoneta de Teófilo
Batista de Carvalho, o centromédio Lacraia, dos primeiros anos do clube, os
Valença, de cuja verve saiu o hino oficial do Santinha, compuseram o PAPA
TAÇAS, frevo-canção destinado a louvar o Tricolor.
A “poeira”, como é conhecido o degrau mais baixo da escada
social, que desde o início do Santa Cruz povoa torcida, é mencionada na música:
Quem é que quando joga
A poeira se levanta
É o Santa, é o Santa
Escreve pelo chão
Faz miséria e não se dobra
É a cobra, é a cobra
É sem favor o maioral
O tricolor, a cobrinha coral
O mais querido timão das massas
Por apelido o papa-taças”
Raul, em pé, e João Valença |
HINO OFICIAL DO SANTA CRUZ
Os Irmãos Valença são os autores do hino oficial do Santa.
Nos anais, nos calendários
Fiquem sempre por lembrança
Teus lauréis extraordinários
De bravura e de pujança,
Nos esportes tua história
É orgulho a que fez jus
Este símbolo de glória
Que é teu nome
Uma voz proclama e canta
É a voz das multidões.
Santa Cruz, querido Santa!
Campeão dos campeões
Esta multidão tamanha,
Lembra o ouro que se apanha
Nos cascalhos e na lama
Esse ouro é sangue e vida
É delírio, raça, e amor
A bandeira tão querida
A bandeira tricolor
GETÚLIO NO CENTENÁRIO
Todos que acompanham o futebol pernambucano conhecem o amor do
compositor e cantor Getúlio Cavalcanti pelo Santinha. Quando o Mais Querido
completou 100 anos de existência, em 3/2/2014, o notável tricolor homenageou o
clube de seu coração, com o frevo denominado HINO DOS 100 ANOS:
Santa Cruz, cem anos de paixão
Quem nasceu tricolor
No Arruda vibrou
Embalando a Torcida
Tem a glória de ser
De sorrir, de viver
Todo encanto da vida
Tendo sangue vermelho
O preto é espelho
Da raça que faz
A mais pura nação
Que enfeitou seu pendão
Com o branco da paz
Vai, meu Santa Cruz
Maior torcida do Brasil tu és
Neste Centenário
És santuário que encanta teus fiéis
Vamos te ofertar
Com muito orgulho nosso coração
Cem anos de amor
Por ti, tricolor
Tri super campeão
Tri, Tricolor
Tri, Tri, Tri, Tri, Tricolor
Getúlio, que ainda na infância em Camutanga, onde nasceu, por
coincidência morava na Rua Santa Cruz, deu outra contribuição ao movimento
musical tricolor, ao compor o frevo A COBRA FUMANDO, que simboliza o
bloco carnavalesco fundado em 1993, com o mesmo nome. Vejamos:
A cobra fumando
Saiu da toca
E foi pra rua frevar
Vou cair no paço
Vou virar bagaço
Ninguém vai me segurar
Brincar com veneno
Da cobra coral
De porre neste carnaval
Se não for tricolor, meu senhor
Garanto que vai se dar mal
A Cobra Fumando
Chegou pra valer
É tricolor!!!!
É tricolor!!!!
Olê, olê, olá
IRMÃO DE CAPIBA
Quem também deixou seu nome inscrito entre os que enalteceram o
Santa Cruz, através das pautas musicais, foi Marambá. Apaixonado pelo Clube das
Multidões, como o irmão Capiba, José Mariano da Fonseca Barbosa, clarinetista,
pernambucano de Surubim, compôs em 1959, o frevo-canção . COBRA CORAL, em parceria com Geraldo
Costa, gravado por Rubens Cristino, sob o selo Mocambo, da gravadora Rozenblit.
A orquestra era do eclético, em matéria de frevo de clube, mas de coração
tricolor, Nelson Ferreira. Música curta, que dá mais evidência à execução
metálica.
Quando aparece num gramado
O Santa Cruz dando xaxado
O adversário vai cair
Disso não pode fugir
Deixa a fumaça subir
Deixa queimar, não faz mal
Podem mexer com toda cobra
Menos com a cobra coral.
O CARTOLA QUE VIROU MITO
Não são todos, mas existem cartolas que são
glorificados como ídolos. Era o caso de James Thorp, na época em que o Santa Cruz, depois de
tirar o pé da lama, em 1969 –, tinha sido campeão pela última vez em 1959 –, além
de desbancar o hexacampeão Náutico, mandou no futebol pernambucano cinco anos
seguidos – 1969/73.
O milionário recifense James Mark Soutton Thorp, filho de
inglês, principal acionista do braço nacional da White Martins, jogou uma
fortuna no Santa Cruz e teve tudo a ver com aquela fase tricolor, pois pelo
menos durante um bom tempo, financiou o clube. Era chamado pelo povão de Seu
Jime, O Galego ou O Inglês.
Apesar de torcer pelo Náutico, o músico Inaldo Vilarim
dedicou-lhe um frevo-canção com o nome quilométrico de JAMES THORP, SANGUE NOVO NO VELHO
TRICOLOR. Vilarim
começa a música usando uma frase do bolero DEZ ANOS, gravado pela genial
Emilinha Borba, que fez muito sucesso durante décadas:
Assim se passaram dez anos
Sofremos calados com resignação
Mas esse ano a coisa mudou
E o Santa voltou a ser o grande campeão
A torcida tricolor ficou contente
Se Deus quiser vai ser assim daqui pra frente.
É dessa época, também, o ARRANCOU PRA VALER, da dupla Delange Dolores e
Fernando Leite Cavalcanti:
Falavam que no Santa Cruz
Tinha uma cabeça de burro enterrada
Mas James Thorp chegou
E arrancou a danada
Agora tudo mudou
Vocês viram que a torcida mudou
Agora tudo mudou
E a alegria reinou
No coração tricolor.
Da mesma dupla é TRÊS
LISTRINHAS, igualmente frevo-canção, em que é mencionado o
Mundão do Arruda, como é popularmente conhecido o Estádio José do Rego Maciel,
onde em 1972 foi disputada uma chave – Chile, Eire, Equador, Irã e Portugal –
da Copa Independência, a Minicopa, com que se comemorou em todo o Brasil,
o 150º aniversário da independência nacional.
Eu este ano vou brincar
Com meu amor
No carnaval tricolor
Minha camisa vai ser
De três listrinhas
Vermelha, preta e branca
Em homenagem à cobrinha
Perto da sede
Seu estádio é um cenário
Palco da Minicopa
No Sesquicentenário
Dessa época é também EUFORIA TRICOLOR, frevo-canção constante do elepê Ecos do Carnaval, volume 2, lançado pelo cantor
Arlindo Melo para o Carnaval de 1978. Autoria de Osvaldo G. de Araújo e José
Júlio de Lima. Eis a letra:
Eu salto, pulo e grito
É claro que estou certo
Não adianta esta retranca
O meu
time joga aberto
Meu time é arrojado
Já me disse um torcedor
Que anda até cansado
De tanto gritar gol
Quá, quá, quá, quá
Ora povo, meu time é forte
Temos craques pra seleção
Caramba, aguenta as pontas
Vou pular, vou gritar
Não leve a mal
Jogar com o Santa
O trunfo é pau.
COBRA VENENOSA
Outros
frevos-canção que enaltecem o Mais Querido, fazem parte do CD Veneno da Cobra,
produzido mais recentemente pelo tricolor, compositor e carnavalesco Bráulio de
Castro, que infelizmente já nos deixou. O disco tem a apresentação do
jornalista Paulo Moraes, tricolor como Bráulio.
Os primeiros três
frevos aqui focalizados são de autoria do próprio Bráulio de Castro, começando
por NASCI SANTA CRUZ, gravado
por Bubuska:
Não
adianta mudar, seu dotô
Meu
coração será tricolor
Eu
não me canso de dizer
Sou
Santa Cruz até morrer
É
o mais querido
O
mais aplaudido
Nossa
tradição ele traduz
Toda
criança chora quando nasce
Mas
eu nasci gritando Santa Cruz
(Bateria: Enoque, sax-alto: Enrico Monteiro,
trompete: Bruno Dias, trombone: Nino, pandeiro: Walmir Chagas, o Véio Mangaba –
baixo; e teclados: Bruno Dias)
COBRINHA SAPECA
(Bráulio
de Castro-canta Bubuska).
Lá
vem a Cobra
Fazendo
o maior sururu
Lá
vem a Cobra
Levantando
a poeira do chão
Lá
vem a Cobra
Fazendo
o maior sururu
Vem
traçando timbu
E
comendo leão
Que
Cobrinha sapeca
Que
Cobrinha de raça
Quando
entra em campo
Faz
vibrar toda massa
Ela
traça timbu
Ela
come leão
Essa
Cobra Coral
É
mesmo o bicho-papão
(Bateria: Enoque, sax-alto: Enrico Monteiro,
trompete: Bruno Dias, trombone: Nino)
A COBRA VAI FUMAR
(Bráulio
de Castro e Ed Carlos, canta Ed Carlos)
Ê,
ê, ê, ê
Ê,
ê, ê, ê
Ê,
ê, ê, ô
Ê,
ô, ê, ô
Sou
Santa Cruz
Sou
tricolor
Com
muito amor
Um,
dois, três, o show vai começar
Um,
dois, três, a Cobra vai fumar
(Bateria: Enoque, sax-alto: Enrico Monteiro,
trompete: Bruno Dias, trombone: Nino, pandeiro: Walmir Chagas, coro: Fátima de
Castro, Bráulio e Chico Nunes)
SANTA, CAMPEÃO ARRETADO
(Fernando
Neves e Leôncio Rodrigues, canta Ed Carlos)
Santa
do meu coração
Time
das multidões
Serás
sempre campeão
Lá
fora ou no Arrudão
O
teu nome é respeitado
Será
sempre o mais querido
E
quando estás arretado
Tomem
cuidado, é um perigo
A
galera toda gritando
Santa
Cruz campeão afamado
O
rival calado, humilhado
Sai
de bandinha, apavorado
(Bateria: Enoque, sax-alto: Enrico Monteiro,
trompete: Bruno Dias, trombone: Nino, pandeiro: Walmir Chagas – Véio Mangaba –
baixo e teclados: Bruno Dias)
PAPAI TRICOLOR
(Frevo-de-bloco
de Fátima de Castro-canta Fátima de Castro; violão-Fátima de Castro, flauta-Laurivan
Barros).
Papai
um dia
Me
ensinou a ser feliz
Olhar
a vida
Com
respeito e muito amor
A
ser criança
Cultivar
minha paixão
E
conservar
Meu
coração bem tricolor
Sinto
saudade
De
ouvir papai falar
Que
o seu Santa
Ninguém
pode segurar
Guardo
comigo
Toda
sua emoção
Quando
gritava
Santa Cruz é campeão
MAESTRO FORRÓ
Tricolor da nova geração, Maestro Forró sempre estranhou o fato de no longo repertório de músicas dedicadas ao Santa Cruz não haver haver um frevo de rua. Sua estranheza se tornava maior pelo fato de "Come e Dorme" e "Casá-Casá", que homenageiam Náutico e Sport, respectivamente, terem sido compostos pelo inesquecível Nelson Ferreira, torcedor da Cobra Coral. Por ocasião do centenário do Mais Querido, Forró fez VULCÃO TRICOLOR, inspirado num dos frevos citados, e deu parceria póstuma a Nelson.
James Thorp, o cartola festejado, com a mulher Carmen |
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