Evandro Carvalho
Advogado e presidente da Federação Pernambucana de Futebol (FPF-PE)
(Artigo publicado pelo DIARIO DE PERNAMBUCO)
Foto: reprodução BBC News Brasil |
A violência é um fenômeno comportamental inerente à natureza humana. Porém, a forma como ela se manifesta possui uma forte relação com a cultura da sociedade na qual o indivíduo está inserido e a complexa relação do “ser humano x violência” extrapola, e muito, as quatro linhas dos campos e estádios de futebol.
A sociedade brasileira enfrenta as consequências da violência urbana desde meados dos anos de 1950, oportunidade em que aconteceu a incidência do fenômeno das migrações internas, também chamadas de migrações inter-regionais, quando milhões de pessoas deixaram o interior rural rumo às capitais que se industrializavam, em busca de melhores oportunidades de trabalho.
A partir de meados do século passado o Brasil deixou de ser um país interiorano
e passou a ser um recanto no qual a atividade econômica industrial acontecia
nas capitais e grandes cidades. Com isso tem início uma tremenda transformação
nos costumes e tradições, com reflexos em toda a sociedade.
Os torcedores com mais de cinquenta anos se recordam de jogos de futebol nos
quais não havia a separação de torcidas adversárias, todos assistiam aos jogos
“juntos e misturados”, sem maiores episódios de agressões dentro dos estádios.
Estávamos no período compreendido entre as décadas de 1950 e 1970.
Já no final dos anos 1970, foi adotado em todos os estádios brasileiros o
costume da separação de torcidas de maneira que a simbiose entre torcedores
adversários não mais ocorria e cada agremiação passava a ter seus apoiadores
segregados dos do time rival no campo de futebol.
Entre as décadas de 1950 e 1970, pouco da cultura de respeito e urbanidade
havia sido modificada em nosso país. Os valores oriundos de um “Brasil rural”
ainda prevaleciam e às famílias cumpria o papel de ser a via de formação moral
e comportamental da juventude. Com o passar dos anos, esta realidade foi
radicalmente transformada.
E o reflexo dessas mudanças repercutiu nos campos de futebol, pois justamente a
partir do início dos anos de 1980 passamos a ter notícias dos primeiros episódios
de violência com maiores consequências dentro dos estádios.
Nos anos de 1990, surge com toda força o fenômeno das “torcidas organizadas” em
todo o nosso território brasileiro. Inicialmente entidades com foco na
motivação das agremiações durante as partidas de futebol e depois verdadeiras
facções criminosas envolvidas em atos ilícitos das mais variadas espécies.
Já nos idos dos anos 2000 a praga da violência institucionalizada, massivamente
via “torcidas organizadas”, estava generalizada em todos os estádios
brasileiros.
Vários episódios de brigas, tentativas de homicídios e tráfico de drogas
invadiram os jornais e programas policiais tendo sempre membros dessas
entidades como protagonistas. Cada vez mais as famílias se afastavam das praças
esportivas por conta da violência e medo.
Atualmente, a escalada da violência realizada pelas “torcidas organizadas”
atinge um novo patamar, muito além do entorno dos estádios nacionais. Por conta
dos efeitos da pandemia da Covid-19 as torcidas foram impedidas de acompanhar
os jogos ao vivo nos estádios e, com isso, restou claro que o futebol é mais
uma vítima da violência gerada por marginais infiltrados nas organizadas.
Pois, uma vez que a presença de público se encontrava vetada por medidas
sanitárias, os criminosos passaram a marcar rixas em bairros afastados mais de
10 km das praças esportivas. Ou seja, não é o “calor das partidas” o estopim da
agressividade, mas sim o simples desejo marginal em delinquir.
Resta provado que o assunto da violência relacionada indevidamente ao futebol é
assunto de segurança pública e não da seara do esporte. Urge que as autoridades
competentes, sobretudo os membros do Senado e da Câmara dos Deputados, reajam a
esta escalada da violência e endureçam as penas cominadas aos marginais que
agridem, depredam e matam sob a desculpa de serem “torcedores”.
Somente a mão pesada da lei poderá ter o condão de afastar em definitivo da
sociedade os criminosos que maculam a tradição do futebol brasileiro, trazendo
prejuízos não só para os clubes, mas também para toda a indústria do futebol
que gera milhões de reais em impostos, riquezas e milhares de postos de
trabalhos diretos e indiretos.
É necessária a adoção rápida e enérgica de medidas que devolvam os estádios às
famílias brasileiras e tragam de volta o brilho que foi retirado por conta da
violência, que vitima não só a nossa sociedade brasileira, sendo igualmente
maléfica ao futebol nacional
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