Toco, travo e canela


A malandragem de Pescoção e a esperteza de Eládio

O estatístico Eliud Oliveira Leite, conhecido nas lides esportivas, como Pescoção, acompanhou muitos acontecimentos do futebol pernambucano, tendo durante boa parte de sua vida, arquivado fichas técnicas, inicialmente dos jogos do time do seu coração, o Santa Cruz, e depois também dos adversários do Tricolor.

A grande história desse personagem na área futebolística aconteceu em 1931. Por obra do acaso, ele tornou-se o primeiro goleiro campeão juvenil pelo Santa, cuja camisa vestiu até 1936, após o que se transferiu para o Sport. Atacante, ia ser inscrito na então Federação Pernambucana de Desportos para jogar pela equipe de juvenis da Cobra Coral. Mas foi vetado por causa de sua altura. Tinha 1,74 metro, e, curiosamente, o regulamento do campeonato não permitia a presença de jogadores acima de 1,60 metro.

A solução proposta por um dirigente do Santa Cruz foi que Pescoção encolhesse as pernas no momento em que o pessoal, na FPF, fosse medir sua altura, o que constituía um item obrigatório, mas executado de maneira simplória, para o atleta se inscrever.

Justamente por causa do estranho veto aos que ultrapassavam a estatura estabelecida, Pescoção seguiu o conselho do cartola. Foi aprovado. Com as pernas dobradas, passou no pau do canto. Ao se encolher, terminou ficando exatamente com 1,60 m.

Feliz da vida por ter engabelado a Federação e se habilitado para vestir a camisa 9 do juvenil do Arruda, o centroavante abestalhou-se. Em vez de se mandar, logo depois da aprovação, para evitar suspeitas, ele ficou zanzando na FPD, já desencolhido. Estava, portanto, na sua estatura normal. Isso despertou a atenção do diretor de Juvenis da entidade, o mais tarde presidente do Náutico, Eládio de Barros Carvalho.

Matreiro, o dirigente ficou sem entender como uma pessoa tivesse crescido tanto em poucos minutos, como Pescoção. Um verdadeiro fenômeno, ironizou. O baixinho Eládio, que apesar da pequena estatura tinha sido goleiro, com uma ponta de picardia, chegou junto do atacante e dirigiu-lhe uma pergunta, de supetão:


– Ô Eliud, como é que tu tens somente um metro e sessenta centímetros, se eu em pé quase alcanço tua barriga com a minha cabeça?


O astuto Eládio descobriu a farsa

Pescoção ficou meio sem graça, e Eládio propôs outra medição. O jogador repetiu a posição anterior, com as pernas dobradas, levando o astuto Eládio a bater nas suas coxas e indagar ironicamente:

– Tu andas assim pela rua, é?

Pediu para o atleta dar uma ligeira caminhada pela sala. O jogador não teve outra saída, a não ser cumprir a determinação do diretor da Federação. Como não poderia de ser, a tentativa da burla foi descoberta.

A atitude tomada pelo Santa Cruz, depois de Pescoção ter sido barrado pela FPD, como atacante, foi escalá-lo de goleiro, única posição em que um juvenil podia passar de 1,60 m. E foi assim que ele entrou para a história do Tricolor do Arruda.

Mais tarde, já atuando no segundo time – o juvenil era o terceiro – sem as exigências do ‘juvena’, como os jogadores se referiam ao juvenil, é que Pescoção teve condições de atuar no ataque, de onde tinha sido forçado a sair.

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